Friday, February 12, 2010

A colunata da fachada poente do Louvre.


Aproveitando que estamos em época de virem os podres políticos ao de cima, cá vai, o que para mim, constitui a radical mudança no modo de pensar, entre o Homem da antiguidade e medieval e, o Homem dito moderno. A fagulha que origina a querela dos Antigos e dos Modernos, que por sua vez resulta na revolução francesa, o romantismo do século XVIII, os efémeros e, passageiros, movimentos artísticos do século XX (art nova, art déco, etc..) e, o culminar numa profunda crise filosófica e, artística com a qual somos contemporâneos, maioritariamente inadvertidos de que vivemos um século perfeitamente bárbaro, uma vez que nenhum valor é sustentável e, justificável senão pela premissa de uma cobiça própria, sem qualquer sustento filosófico.
De uma forma muito sucinta, o modo de pensar do Homem Antigo pautava-se pelas noções de Bem e de Belo consubstanciadas essencialmente naquilo que o transcende, a procura dos arquétipos, sendo que o arquétipo de todos os arquétipos era Deus e, as artes, como as ciências, procuravam aproximar-se deste valor arquétipal máximo, em plena consciência de que este seria inatingível, uma vez que, matematicamente, se fosse atingido tornar-se-ia perfeito, logo eterno, logo fora do contexto de espaço e, de tempo.
O Homem Moderno rege-se unicamente por ele mesmo, não acredita num valor transcendente que possa regular a sua questão do gosto e, afirma simplesmente que o critério de validade e qualidade de Bem e, de Belo é-lhe subjectivo e, exclusivo. Um jogo sem regras portanto permissivo a que tudo seja valido, regulado tanto quanto seja, pela vontade das massas, em termos qualitativos, o pior a que se pode reger: a democracia, o governo pelos piores.

Eis o que desplota então este pensamento individualista e, prepotente:

"Jean-Baptiste Colbert, sem dúvida um dos maiores construtores desde a Antiguidade, que já detinha grande fatia de influência sobre as obras reais, é nomeado Surintendant et Ordonnateur Général des Bâtiments, Arts, Tapisseries et Manufactures de France (trad.: Superintendente e Ordenador Geral das Construções, Artes, Tapeçarias e Manufacturas da França), em 1664.
Ele teria adorado inspirar o novo gosto; apesar das suas qualidades reconhecidas (inteligência, amor ao trabalho, tenacidade e, eficácia), pouco mais na sua formação do que na sua personalidade o qualificavam a ser um promotor nesta matéria.
Oponha-se portanto a Le Vau, Primeiro Arquitecto, tradicionalista e, iniciático, apoiado pelo Rei, e que não via com bons olhos o domínio exercido por Colbert nesta área restrita, Colbert, filho de um negociante de panos, autoritário e, pouco competente (pelo menos assim o julgava Le Vau).

Colbert tinha como amigo o Receveur Général des Finances de Paris (trad.: Colector Geral das Finanças de Paris), Perrault, tanto sedutor como belo, o mais velho dos Perrault, familia composta por cinco notáveis irmãos, todos Modernistas determinados. Nos gabinetes do Receveur trabalhava o seu irmão mais novo, Charles que, andava tomado de paixões pela arquitectura, após banais estudos de Direito em Orléans (...); ele pertencia pois àquela espécie que mete os profissionais de pé atrás: o amador iluminado, cheio de ânimos que, num domínio que o apaixona, sabe, ou pelo menos pensa saber, mais do que qualquer outro e, sobretudo, mais do que os profissionais, em particular.
Colbert nomeia assim, em 1663, Charles Perrault, premier Commis de la Surintendance (trad.: primeiro Escriturário da Superintendência), cargo que este conservará durante quinze anos, até 1678; ele só abandonará este cargo no seguimento de uns desentendimentos entre Colbert e o Receveur Général des Finances, convencido de algumas irregularidades contabilizáveis.

Colbert estava geralmente seguido, no seu cargo, por três Intendentes e três Controladores, formando com ele o Conselho das Construções Reais, e por uma pequena comissão composta por Le Vau, Primeiro Arquitecto; Charles Le Brun, Primeiro Pintor; e François Mansart, antigo Primeiro Arquitecto. Esta comissão escolhia os arquitectos e decidia sobre a arquitectura dos projectos; mas rapidamente foi Charles Perrault quem decidia tudo e que praticamente se afirmara como Mestre de Obras, e isto quase até ao fim da sua carreira.
Repare-se que também, aquando da morte de François Mansart em 1666, Charles Perrault faz nomear para o suceder na pequena Comissão, aquele que se tornaria o teorico dos Modernos, o seu irmão e médico, Claude Perrault, distinta personalidade, membro da Academia das Ciências, igualmente entusiasta da arquitectura mas sem nunca ter construído nada; o que fez logo agitar as opiniões da velha guarda.

Na ocasião de terminar a fachada do Louvre sobre Saint-Germain-l'Auxerrois, Colbert reúne o seu pequeno Conselho a quem encarrega esta tarefa.
O pequeno Conselho, que decidira delegar sobre o arquitecto d'Orbay a tarefa dos desenhos técnicos, não conseguiu chegar a consenso quanto à opção arquitectónica.
Le Vau, Primeiro Arquitecto do Rei, e, Le Brun, Primeiro Pintor do Rei, não conseguiram resistir por muito tempo ao assalto estratégico dos Perraults e, o médico-arquitecto, protagonista da ideia de uma colunata já precedida por Léonor Houdin, em 1661, procederá quase sozinho à construção (secundado por d'Orbay).
As fundações de Bernin serão então demolidas para em 1670, a grande obra da actual colunata estar concluída; em 1672 estaria a ser colocado o frontão; em 1678, finalizava-se a cobertura.

Todavia a obra tinha levantado suspeitas: como é que o irmão do Primeiro Escriturário, médico sem qualquer experiência, desdenhando as regras tradicionais da composição e, da construção, poderia ter sido encarregue de um dos dois mais ilustres estaleiros de França (sendo o outro Versailles, juntamente com Le Vau).
(...)
Quanto à construção, a técnica era deplorável: as armaduras de ferro com as quais Perrault havia estruturado a colunata fizeram estalar a pedra e Jacques-Ange Gabriel, arquitecto do Rei, teve de praticamente tudo reconstruir em 1735; a promenorização não ia por melhores caminhos: as caleiras não escoavam a água, os caixilhos não jogavam em conformidade, etc.."

Jouven, Georges. L'architecture cachée, tracés harmoniques. Dervy-Livres, Paris: 1986. pags. 14-15-16-17. ISBN: 2-85076-104-4

E assim, o jogo político de Colbert desejoso de deitar mãos às obras reais, juntamente com um impulso de capricho de Perrault, produzem não só apenas um claro desastre arquitectónico como virão a ser a acendalha inicial para a destruição sucessiva do pensamento filosófico (filosofia como cerne de um prisma multifacetado cujas suas faces serão as mais diferentes áreas como a sociedade, politica, cultura, arte, ciência, etc.. ) em abono de sucessivos caprichos pessoais cada vez mais efémeros e passageiros: o actual materialismo.


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